terça-feira, 5 de julho de 2011

AUTOIMAGEM E LIDERANÇA: A RESTAURAÇÃO DA IDENTIDADE DO SERVO

 

Uma das figuras que a Bíblia usa para se referir a nós cristãos como membros da família de Deus é a palavra “servo”. Fomos resgatados por Cristo não somente para sermos reconciliados com Deus e sermos chamados de seus filhos, mas também para servir, com a finalidade de manifestar a Glória do nosso Senhor e instituir o seu Reino.

O objetivo deste pequeno texto é mostrar como a nossa autoimagem e o orgulho influenciam de forma determinante a forma como exercemos poder e liderança em relação ao nosso semelhante no nosso sistema de relações sociais e religiosas.

Leia o texto abaixo de Marcos 10:35-45, observando as palavras sublinhadas a respeito desse tema:

Então, se aproximaram dele [Jesus] Tiago e João, filhos de Zebedeu, dizendo-lhe: Mestre, queremos que nos conceda o que te vamos pedir. E lhes perguntou: Que quereis que vos faça? Responderam-lhe: permite-nos que, na tua glória, nos assentemos um à tua direita e o outro à tua esquerda. Mas Jesus lhes disse: não sabeis o que pedis. Podeis vós beber o cálice que eu bebo ou receber o batismo com que eu sou batizado? Disseram-lhe: Podemos. Tornou-lhes Jesus: bebereis o cálice que eu bebo e recebereis o batismo com que eu sou batizado; quanto, porém, ao assentar-se à minha direita ou à minha esquerda, não me compete concedê-lo; porque é para aqueles a quem está preparado. Ouvindo isto, indignaram-se os dez contra Tiago e João. Mas Jesus, chamando-os para junto de si, disse-lhes: Sabeis que os que são considerados governadores dos povos têm-nos sob seu domínio, e sobre eles os seus maiorais exercem autoridade. Mas entre vós não é assim; pelo contrário, quem quiser tornar-se grande entre vós, será esse o que vos sirva; e quem quiser ser o primeiro entre vós será servo de todos. Pois o próprio Filho do Homem não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida em resgate por muitos.



Nesta passagem do Evangelho de Marcos, Jesus ensina aos seus discípulos como o poder e a liderança são exercidos no Reino de Deus no desempenho do servir. Pode-se extrair do texto os seguintes princípios e observações:

I- Quando o coração do homem é dominado pelo engano e pelo orgulho, ele busca sempre a posição de destaque e poder em qualquer que seja a relação social, sem se esvaziar de si mesmo e sem querer o benefício de todos, mas tão somente a satisfação de interesses e desejos pessoais egoístas. As pessoas buscam cada vez mais poder e destaque, tendo pretensões “megalomaníacas” e usam o Evangelho de Jesus para tornar o seu nome célebre, tal como fizeram os construtores da Torre de Babel (Gn 11:4).

II- As pessoas que buscam o seu senso de valor em posições, em cargos, em poder para se satisfizer pessoalmente exercerão o seu poder e sua liderança de forma dominadora, autoritária, abusiva, arrogante, usando de ameaças, medo, manipulação e punição, ainda que de forma velada, em relação aos seus liderados para atingir seus objetivos de busca pelo poder e posições. Os liderados não serão a finalidade do trabalho ministerial, mas serão “meios”, meras marionetes, as quais o líder usará para conseguir preencher seus desejos de autoafirmação.

III- Os olhos espirituais de Tiago e João, neste episódio, não tinham se aberto para a missão de Jesus, a de servir e dar a sua vida em resgate pelos nossos pecados; estavam cegos e espiritualmente enganados; assim somos nós, quando estamos dominados pelas nossas próprias vontades, cultivando o nosso “eu” pecaminoso, sem olhar o nosso próximo em suas necessidades.

IV- O modelo de liderança e exercício de poder no Reino de Deus é diferente e requer de nós sacrifício pessoal em favor das necessidades do outro e da salvação dos perdidos; sacrifício de nosso tempo, dos nossos recursos, dos nossos prazeres e vontades, do nosso conforto muitas vezes; exige a morte do nosso “eu” pecaminoso e do nosso orgulho.

V- A liderança e exercício de poder no Reino de Deus só podem ser bem sucedidos se o nosso senso de valor como pessoas, a nossa identidade, a forma como nos vemos e nos estimamos em nossa mente e emoções (= autoimagem) estiver em Deus, de modo que sejamos cheios dos frutos do Espírito Santo, sendo à imagem e semelhança de Cristo.

VI- Quando vivemos para Jesus e encontramos nEle o nosso valor e desfrutamos do amor incondicional de Deus que nos aceita, cooperamos com o que Ele faz e faremos as obras ainda maiores que Jesus disse que faríamos, sem esperar qualquer recompensa e elogio dos homens, estando dispostos a, se necessário for, dar também a nossa vida em favor de muitos.

Todos nós como seres humanos exercemos liderança em determinadas áreas de nossas vidas, seja no trabalho, na família como pais, na igreja, em grupos, ou exercemos poder em alguma medida, seja organizando alguma tarefa, seja influenciando pessoas de forma positiva ou negativa através de nosso jeito de ser, personalidade, sorrisos, presentes, afetando de alguma forma as pessoas com as quais convivemos.

A forma como exercemos poder e liderança é determinada pelo nosso caráter e este é construído pela forma como nos vemos e buscamos o nosso senso de valor, o que chamamos de autoimagem, ou seja, o retrato que temos acerca de nós mesmos em nosso coração (= mente e emoções).

Se a nossa autoimagem está fundamentada no nosso “eu”, no orgulho, seja qual for a fonte dos mesmos, exerceremos poder e liderança de forma a dominar, manipular pessoas e circunstâncias para que elas se encaixem do jeito que melhor satisfaz as nossas necessidades pessoais e estaremos longe do modelo de Jesus, o de servir o outro sem esperar a recompensa dos homens; desenvolveremos também a religiosidade; às vezes, realizaremos obras em grande quantidade (ativismo religioso) e/ou teremos uma vontade intensa de competir com os outros para mostrar o nosso valor como pessoas, o que no fim não é nada mais do que insegurança acerca de nós mesmos, do nosso valor como pessoas que sempre dependerá da opinião dos outros quando buscamos o elogio humano; traremos as pessoas para nós e não para Cristo.

A finalidade primeira de todo serviço cristão é manifestar a Glória de Deus sobre a vida das pessoas. A Glória é de Deus e a Glória que é dele, Ele não divide com ninguém. Se nos apropriamos de uma Glória que é de Deus, arcaremos com as graves consequências. Nem mesmo Davi, o homem segundo o coração de Deus, escapou do castigo por ter feito um censo do povo de Israel de forma pecaminosa, orgulhosa, juízo este que afetou os seus liderados também (1 Cr 21). O episódio de Davi mostra o que pode acontecer conosco se exercemos a nossa liderança e poder de forma pecaminosa para satisfazer os desejos do nosso “eu”, trazendo graves consequências para os liderados ou pessoas que exercemos influência e poder. Para o povo de Israel o resultado foi uma praga que trouxe morte para muitos e Davi ainda teve de conviver com a lembrança dolorosa de que a responsabilidade por isso foi dele.

E você pode pensar: hoje é tempo de graça, Deus não vai nos punir desse jeito. A morte que você pode trazer sobre seus liderados pode até não ser física, mas com certeza trará repercussões espirituais e emocionais. Um dia a máscara vai cair porque Deus tem compromisso com a manifestação da verdade e Ele removerá o “cajado” do líder e quanto maior a posição, maior a repercussão do “tombo”, da queda, os liderados irão descobrir tudo e só Deus para administrar as consequências e curá-los da frustração, das mágoas, das decepções. Deus cobrou o sangue da cabeça de Davi e também cobrará a nossa responsabilidade pelo que temos feito (aqui, gostaria de indicar o livro “Feridos em Nome de Deus”, de Marília de Camargo Cesar, da editora Mundo Cristão, com a finalidade de aprofundamento do tema da liderança disfuncional e o tema do abuso religioso; é um livro impactante que ajudará os feridos com a questão de lideranças abusivas a serem restaurados, mas também dará a você armas para detectar falsos mestres e falsos profetas, bem como ajudará a escapar de seus esquemas de manipulação e controle).

O segundo objetivo da liderança, exercício de poder e influência no Reino de Deus é edificar o nosso próximo e, por via de consequência, edificar o corpo de Cristo, embelezando a sua igreja, ajudando-nos a crescer no amor, uma vez que a essência do amor de Deus é a “alteridade”, isto é, um amor que é praticado em direção ao outro, ao próximo e suas necessidades. O serviço cristão tem de ser para nós uma excelente oportunidade para mortificar o nosso egoísmo, um exercício do negar-se a si mesmo.

Por fim e não menos importante, serviço também implica em prestação de contas, o que faremos em relação a Deus com certeza, mas também devemos fazer em relação aos nossos guias espirituais. Faz parte de ter uma vida de transparência, do andar na luz.

Lembre-se: Provar que temos valor é uma necessidade pecaminosa nossa e não de Deus. Busque em Deus o seu senso de valor, a sua identidade e mude a forma como você vive e interage com as pessoas, exercendo poder e liderança (aqui indico o livro “Você é alguém especial”, de Bruce Narramore, da editora Mundo Cristão, para o aprofundamento das questões de autoimagem e autoestima à luz da Palavra de Deus). Torne-se um servo valoroso e seja semelhante a Cristo!

Pablo Luiz Rodrigues Ferreira

Julho de 2011

rugidodaverdade.blogspot.com

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