quarta-feira, 24 de agosto de 2011

VENCEDORES SÃO HOMENS DE FIRME PROPÓSITO: reflexões em Isaías 26.



Isaías, dentro da cronologia bíblica dos profetas do Antigo Testamento, falou ao povo de Judá antes do cativeiro babilônico. Deus o chamou para o firme propósito de confrontar o povo de Judá em seus pecados, a sua atitude de desobediência e ajudá-lo a reconstruir sua vida com base nas promessas do Senhor (cf. Bíblia de Estudo Despertar. Barueri: Sociedade Bíblica do Brasil, 2006, p. 759).
Isaías pregou para um povo rebelde e idólatra, que tinha se desviado do Senhor, não mais reconhecendo-O em seus caminhos, nem a Sua soberania em suas vidas  (Is 1).
O resultado do pecado e da desobediência: uma mentalidade reprovável e mundana, uma alma cheia de feridas e uma consciência sobrecarregada de fardos, uma vida arruinada por Satanás e sem muros de proteção contra suas investidas (Is 1:5-7).
Contudo, mesmo diante de circunstâncias tão difíceis, Deus chamou aquele povo de volta para si, chamou-o para o arrependimento e para a restauração. Assim como foi com o povo de Judá, Deus não muda e não deixou de nos conceder suas promessas nos dias de hoje, caso nos arrependamos. Deus nunca deixou de nos amar e está pronto a nos restaurar. O preço já foi conquistado na cruz com a morte de Jesus. Da nossa parte, Deus requer arrependimento. O mais Ele fará.
Voltando a nossa atenção para o capítulo 26 de Isaías, tem-se uma mensagem poderosa de restauração que o Senhor envia para todos aqueles que, arrependidos, tornam a buscá-lo.
A obra do Senhor, após o arrependimento e reconciliação com Ele, é conceder-nos a salvação na pessoa de Jesus, fortificando-nos na Palavra, que contém Suas verdades e grandiosas promessas para nós, de modo que possamos resistir às investidas de Satanás. “Deus lhe põe a salvação por muros e baluartes” (Is 26:1). 
 Fortificados na Palavra da Verdade, ganhamos a identidade do reino de Deus, o qual nos transforma em uma “nação justa, que guarda a fidelidade” (v.2). E essa justiça não vem de nós, mas de Deus que nos justifica pelo sacrifício de Jesus. Esta é a chamada doutrina da justificação pela fé (Rm 8).
A identidade do Reino, contudo, não é automática, mas provém de um processo de renovação da mente, o qual é resultado do mover do Espírito Santo, diante da atitude do ser humano. A matéria prima da renovação da mente é o firme propósito: “Tu, SENHOR, conservarás em perfeita paz aquele cujo propósito é firme; porque ele confia em ti” (v.3). Esta é a marca do vencedor em Cristo.
A propósito da renovação da mente, Russell Shedd nos traz alguns argumentos, comentando Isaías 26:3:
Os judeus traduzem aqui: “tu conservarás em paz perfeita a mente que se firma em ti, porque confia em ti”. A palavra “mente” ou “propósito”, heb [do hebraico] yeçer, desenvolve-se da raiz yaçar, “formar”, “moldar”, “imprimir diretrizes”. É a palavra chave da parábola do oleiro, Jr 18:1-18, que mostra que Deus tem o direito de moldar as nações e as pessoas, e que se essas não vivem à altura da sua vocação, Deus pode lançar mão de outra “matéria prima”, rejeitando aqueles que não souberam aceitar as promessas divinas. Se nossa personalidade e nossas diretrizes se voltam para Deus, temos a presente e eterna paz com Deus (Bíblia Shedd. São Paulo: Vida Nova, 1997, p. 1008).
O dicionário de Strong ainda explica que a palavra traduzida por “propósito” ou “mente”, pode também ser traduzida por “imaginação”, o que significa que Deus tem em vista renovar todas as faculdades mentais do ser humano em sua obra de santificação. Você me pergunta: até a imaginação? Sim, até a imaginação, já que o inimigo de nossas almas tem realizado um trabalho intenso de poluição da nossa mente com a pornografia e o erotismo, com desenhos animados, novelas, séries, revistas, sites da internet que distorcem os valores da família e da sexualidade. A imaginação, em síntese, é a faculdade de representar objetos pelo pensamento, a faculdade de inventar, criar, conceber, a faculdade que a mente tem de produzir imagens.
O inimigo, através dos meios de comunicação, deforma a nossa mente, não só através de informações distorcidas, mas também de imagens que degeneram a nossa criatividade e deixam a nossa mente presa ao prazer distorcido da carnalidade pecaminosa. Com a imaginação suja, acabamos não tendo acesso a visão das realidades celestiais e espirituais em nossa mente e não é a toa que a Bíblia afirma, em Hebreus 12:14-15, “segui a paz com todos e a santificação, sem a qual ninguém verá o Senhor, atentando, diligentemente, por que ninguém seja faltoso, separando-se da graça de Deus; nem haja alguma raiz de amargura que, brotando, vos perturbe, e, por meio dela, muitos sejam contaminados”. A mente precisa ser santificada para que tenhamos acesso pleno a “mente de Cristo” que o Espírito Santo infunde em nós através de sua obra de testemunho da verdade (1 Co 2:14-16).
Outra barreira que impede a nossa mente de ser renova é persistirmos na raiz de amargura, ou seja, a falta de perdão, o ódio, o rancor, o ressentimento. A nossa imaginação fica presa em razão das imagens das lembranças dolorosas que nutrimos e não reprocessamos através do perdão, fazendo com que fiquemos reféns da reprodução constante da ofensa dentro de nós e ficamos impedidos de ver com os olhos do Espírito, acrescentando-se ao fato de que vamos sendo transformados à imagem e semelhança desses sentimentos negativos que nutrimos.
A solução é nos deixarmos moldar pelo propósito eterno do Senhor para nós e nos entregarmos à graça dAquele que estabeleceu todas as coisas segundo o conselho de Sua própria vontade (Ef 1:11). O Senhor é Deus que contempla propósitos. De nós mesmos, não temos força para mortificar o “menor” pecado que seja, mas Deus contempla o firme propósito de mudança. Aquele que está disposto de forma decisiva a mudar, abandonando os prazeres transitórios da carne e do mundo, será alvo da graça transformadora de Deus por meio do testemunho interno e eficaz do Espírito Santo. Temos de nos deixar tratar e reconhecer o senhorio de Deus em nossas vidas, permitindo que Ele nos molde conforme a Sua vontade, a fim de caminharmos em Suas diretrizes, Sua verdade e cumprirmos Seus planos para nós.
Temos que firmar um firme propósito de mudança e não ter o que a carta de Tiago chama de “ânimo dobre”, uma mente dividida entre as paixões da carne, sujeitando-nos a Deus completamente. A Bíblia na versão King James Atualizada (KJA) assim traduz o trecho de Tiago 4:7-10, mostrando com maior clareza a questão do ânimo dobre:
Portanto, sujeitai-vos a Deus. Resisti ao Diabo, e ele fugirá de vós! Achegai-vos a Deus, e ele acolherá a todos vós! Pecadores, limpai as vossas mãos, e vós que tendes a mente dividida pelas paixões, purificai o coração, entristecei-vos, arrependei e chorai. Abandonai o riso fácil e pranteai, trocai a vossa euforia pelo pesar. Humilhai-vos na presença do Senhor, e Ele vos exaltará! (grifo nosso). 
Não se pode avançar no Espírito e ao mesmo tempo querer ter uma mente sempre disposta a satisfazer os desejos imorais da carne. Temos que encarar essa realidade, muitas vezes presente em nós e não mais viver em esquemas de negação e fantasia.
A atitude e propósito de mudança movida por uma fé operosa nos conserva em “prefeita paz”.
A paz interior, resultado de uma alma que se entrega ao senhorio de Jesus, é um fruto do Espírito (Gl 5:22), é um componente do andar no Espírito. É a paz que o Senhor comunica a nós que nos capacita a vencer as obras e os desejos da carne.
E é na falta de paz que a carne milita contra o Espírito; a carne, diante da falta de paz interior, tenta nos levar um estado de paz e consolo falsos, os quais aprisionam a alma, ou seja, nossas vontades, sentimentos e desejos, tornando-nos alheios a vida de Deus no espírito. A carne tenta nos dar uma paz que dura pouco e vicia, sendo uma rebelião contra Deus e, assim, sempre produz culpa (cf. HILL, Craig. Seminário Veredas Antigas – Nível I. Pompéia: Universidade da Família, 2000, p. 17). 
Por meio de um firme propósito de mudança, recebemos do Espírito Santo, através dos meios de graça (leitura e meditação na Palavra de Deus, vida de oração, comunhão dos santos, etc.), a capacitação para vencer as obras da carne, tendo os pecados mortificados, gozando de paz interior, fruto da intimidade com Deus.
O firme propósito nos leva a confiar cada vez mais em Deus e esta confiança tem de ser “perpétua”, contínua (v.4), até porque o processo de renovação da mente é feito “de glória em glória”, ou seja, gradualmente, um passo de cada vez. Temos de depositar nossa fé e confiança em Deus uma vez que Ele é a “rocha eterna” que nos ampara, o lugar em que temos refúgio e segurança em nossas lutas. A confiança em Deus e em suas grandiosas promessas é que nos sustenta e nos leva a ter intimidade com Deus. Ele é um Deus pessoal e deseja ter relacionamento conosco, porque Ele nos ama.
 Um obstáculo ao firme propósito de transformação é o orgulho. O Dicionário Aurélio, assim, define o orgulho:
S. m. 1. Sentimento de dignidade pessoal; brio, altivez. 2. Conceito elevado ou exagerado de si próprio; amor-próprio demasiado; soberba. 3. Aquilo ou aquele(s) de que(m) se tem orgulho.
Temos que encarar a realidade de que o orgulho não nos faz avançar na vida cristã. Deus resiste aos orgulhosos e o resultado disso é que seremos pisados, abatidos e humilhados por esta postura e levados até o pó da terra, enquanto não nos arrependermos e aprendermos a depender de Deus (vv.5-6).
 O orgulho é um empecilho tão grande que, mesmo sendo conduzidos e ensinados na verdade e na graça de Deus, muitas vezes nos recusamos a ceder e admitir que estamos errados ou, em estando certos, não queremos e não aceitamos ser questionados. Estamos no meio da instrução do que é justo e correto e ainda nos recusamos a praticar o bem que Deus quer e atentar para Seus caminhos. Neste sentido, o versículo 10 nos coloca essa grande verdade:
Ainda que tenhas compaixão dos maus, mesmo assim eles não aprendem a fazer o que é certo. Mesmo aqui nesse país onde o povo é direito, eles continuam a fazer o que é mau e não se importam com a grandeza de Deus (Nova Tradução na Linguagem de Hoje – NTLH).
Imersos no orgulho, fazemos o que queremos, buscamos as nossas razões e nos autojustificamos, deixando de obedecer ao que Deus nos pede e ao que Ele ensina como caminho reto. Orgulho é perversidade e temos de quebrar essa cadeia de iniquidade. Do contrário, chamaremos para nós a disciplina do Senhor para as nossas vidas, a Sua ira e a vergonha cairá sobre nós, porque Ele é zeloso conosco e não tolera filhos que não se pareçam com Ele (v.11). É melhor obedecer do que sacrificar.
Para aqueles que querem nutrir o orgulho tudo é difícil, haverá um esforço sobrehumano para atingir os mesmos resultados daqueles que andam em humildade, se é que serão atingidos.
Por outro lado, “o caminho das pessoas direitas é fácil” (v.7-NTLH). Temos de nos deixar tratar pelo Senhor, porque é Ele quem endireita nossos caminhos, engolindo as nossas razões, pedindo perdão àqueles que machucamos com o orgulho, fazendo as restituições que se fizerem necessárias, humilhando-nos no reconhecimento da postura soberba e tomando as atitudes corretas segundo os padrões da Palavra, bem como confessando o pecado a fim de recebermos cura (Pv 18:13).
Só assim poderemos ser verdadeiros homens e mulheres de firme propósito e experimentar a paz de Deus, buscando ardentemente a presença do Senhor (v.8).  
Esta é outra marca do homem de firme propósito: a busca constante, ardente e diligente da presença de Deus (vv.8-9). Isto nos fala da necessidade de uma vida diária de relacionamento com Deus, com responsabilidade e, sobretudo, com gratidão e muito amor ao Senhor por tudo o que Ele tem feito, pelo Seu amor demonstrado na cruz do Calvário que nos abriu um caminho de livre acesso a Sua pessoa e o dom da vida eterna. Só assim aprenderemos a justiça de Deus e o Seu caráter, sendo semelhantes a Ele.
Sem amor pelo nada se faz por Ele. Sem amor, tudo é fardo e canseira.
O Senhor anseia pelo nosso amor por Ele e gosta das nossas mais puras afeições, quaisquer que sejam as circunstâncias. Deus quer ter conosco um relacionamento íntimo e amoroso, como de pai e filho. Note o que Ele diz em Jeremias 2:2-3:
Vai e clama aos ouvidos de Jerusalém: Assim diz o Senhor: Lembro-me de ti, da tua afeição quando eras jovem, e do teu amor quando noiva, e de como me seguias no deserto, numa terra em que não se semeia. Então, Israel era consagrado ao Senhor e era as primícias da sua colheita; (...) (Almeida Revista e Atualizada – ARA).
Esta busca de Deus sempre tem de levar em conta o reconhecimento do Seu caráter (v.8: “nome”) uma vez que o nosso alvo é sermos semelhantes a Ele, desejando os frutos do Espírito em nossa vida, enfim, a transformação do nosso caráter, a morte do nosso “eu” para que Deus opere através de nós.
A busca de Deus também tem de ser acompanhada da “memória” dos seus poderosos feitos (v.8). É sempre ter em mente o que Deus já fez por nós e que, assim como Ele operou no passado, no tempo devido, Ele fará novamente e renovará nossa mente e transformará nossa vida já que esse processo é gradual. A “memória” nos convoca a meditar na vida dos homens que a Bíblia relata e de como Deus trabalhou em suas vidas, transformando-as. Todo este reconhecimento da “memória” tem o objetivo de criar em nós o firme fundamento da fidelidade de Deus; Ele promete, opera o querer e o realizar e cumpre sua Palavra.
Um homem de firme propósito reconhece sua dependência de Deus e suplica para que Ele o capacite a andar nos Seus caminhos. Somente o Espírito Santo pode nos capacitar para viver uma vida de santidade e de boas obras e nos guiar dentro de Sua vontade, a qual é conhecida quando experimentamos a paz que Ele comunica no nosso íntimo (v.12).
 Outra marca do homem de firme propósito é a confissão sincera e arrependida do pecado, bem como o reconhecimento das suas graves consequências. Os israelitas, conforme a profecia de Isaías, haveriam de reconhecer que o domínio de forças estrangeiras eram resultado de sua desobediência a Deus e um dia se voltariam para Ele. Temos de reconhecer o que tem nos escravizado: sexo, álcool, drogas, orgulho, ira, rancor, confessando-as e deixando-as para que possamos experimentar a graça transformadora de Deus (v.13).
Não abandonar o pecado é colher morte, mas aquele que se arrepender será transformado e será frutífero e Deus será glorificado na vida dele, fazendo perecer seus inimigos, com a construção de um testemunho forte contra as portas do inferno, capaz de impactar vidas que se entregarão ao Senhor Jesus (vv. 14-15).
O homem de firme propósito reconhece que as circunstâncias difíceis de serem ultrapassadas são fonte de busca do Senhor. Muitas vezes, quando passamos por situações difíceis, por angústias, por desilusões, por perseguição, temos a tendência de achar que o Senhor nos abandonou e está nos castigando por algo que fizemos e que Ele deixou de nos fazer o bem. Dentro deste quadro, passamos a nos sentir rejeitados por Deus, o que é acentuado em pessoas que passam por histórico de rejeição familiar, depressão, complexos de inferioridade.
A grande verdade de Deus é que as circunstâncias difíceis são fontes de crescimento espiritual, de “correção” de nossos caminhos (v.16). A “correção” do Senhor não é algo que chega a nós somente porque fizemos algo extremamente pecaminoso. A correção de Deus tem o objetivo não só de fazer com que nos afastemos do mal, mas também de cultivar em nós as virtudes do caráter cristão.
É também a oportunidade de conhecermos ainda mais o caráter de Deus e de experimentarmos ainda mais intimidade com Deus, derramando nossas orações diante do Seu trono de misericórdia e graça. Nesta ocasião, só consigo pensar na exclamação de Jó, depois de ter passado por grandes angústias, inclusive com a perda da família, de seus bens e de sua saúde, reconhecendo sua ignorância diante de Deus:
Então, respondeu Jó ao Senhor: Bem sei que tudo podes, e nenhum dos teus planos pode ser frustrado. (...). Eu te conhecia só de ouvir, mas agora meus olhos te vêem. Por isso me abomino e me arrependo no pó e na cinza (Jó 42:1-6-ARA).
Após o reconhecimento de Jó e de seu arrependimento, o Senhor restaurou a sua sorte. Jó nunca recebeu todas as respostas e não entendeu o porquê de tudo que lhe aconteceu, mas sabia que podia confiar em Deus, tendo aberto seu coração para receber o que quer que o Senhor quisesse lhe conceder.
Os versículos 17 e 18 comparam o povo a uma mulher grávida, que gemeu, que sofreu dores de parto, mas que deu luz a vento. Essa passagem mostra que somos seres geradores de vida não só no natural, mas também no espiritual. O texto é o reconhecimento de que, muitas vezes, somos infrutíferos e geramos obras mortas em nossa vida. O homem de firme propósito, contudo, reconhece que não é perfeito e é sincero o suficiente para admitir seus erros e pecados, bem como o que não tem sido frutífero em sua vida. Que obras mortas temos praticado e das quais precisamos de arrependimento? Temos de nos fazer essa pergunta constantemente e nos arrepender.  
A outra face da moeda é que o homem de firme propósito busca gerar as boas obras no Espírito através da oração, gerar pessoas, trazendo libertação e multiplicação para o Reino de Deus, pregando a verdade da Palavra, entre outros.
O Senhor nos chama para um nível espiritual mais profundo e de mais intimidade com Ele, a fim de experimentarmos uma vida de “ressurreição”, uma vida em abundância na sua presença. Ele nos convoca a acordar do sono profundo e viver pelo Espírito: “despertai e exultai, os que habitais no pó, porque o teu orvalho, ó Deus, será como o orvalho de vida, e a terra dará à luz os seus mortos” (v.19).


Pablo Luiz Rodrigues Ferreira
rugidodaverdade.blogspot.com
pablolrferreira@hotmail.com

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

A COMPAIXÃO DE JESUS: A RESTAURAÇÃO DA IMAGEM DO CORAÇÃO DO PAI


No Evangelho de João, capítulo 11, vemos a conhecida história da ressurreição de Lázaro. No contexto, Marta e Maria mandaram mensageiros a Jesus para dizer que Lázaro, irmão delas, a quem Jesus amava, estava enfermo. Recebendo a notícia, Jesus logo declarou o propósito da doença de Lázaro: “Esta enfermidade não é para a morte, e sim para a glória de Deus, a fim de que o Filho de Deus seja por ela glorificado” (v.4). O texto expressamente declara que Jesus amava Lázaro, Marta e Maria, mas ainda se demorou quatro dias no lugar onde estava, e, findo o tempo, Jesus instou os seus discípulos a irem juntos até Betânia, pelo que estes lhe advertiram de que os judeus já tinham procurado apedrejá-lo naquele lugar e que ele corria risco de vida ao voltar para lá, contudo, Jesus foi sabendo que tinha de cumprir a vontade do Pai na ressurreição de Lázaro; a incredulidade ainda tinha tomado o coração de Tomé que declarou que os discípulos estavam indo para Betânia ser mortos junto com Jesus (vv. 5-16).
Enfim, Jesus chega em Betânia, já havia quatro dias que Lázaro tinha falecido, as irmãs ainda lamentavam pela morte do irmão e os judeus ainda estavam a consolá-las pela perda.
Marta conhecia Jesus e sabia dos milagres que Ele podia operar, sabia que Ele poderia curar seu irmão se estivesse com eles no tempo da enfermidade, contudo, ela declarou a Jesus que, mesmo naquela circunstância, Deus ouviria o que Ele pedisse. Marta passou a desenvolver uma fé em Jesus no sentido que Ele tinha autoridade sobre a morte (vv. 17-22), pelo que Jesus, além de dizer que Lázaro haveria de ser ressuscitado do túmulo, declarou a verdadeira natureza do Espírito de ressurreição: “Eu sou a ressurreição e a vida. Quem crê em mim, ainda que morra, viverá; e todo o que vive e crê em mim não morrerá, eternamente” (vv.25-26). Marta, então, declara que ela crê nessa verdade e que Jesus é o Filho de Deus.
Esta é uma fé que temos de desenvolver em relação a Jesus.
A primeira lição que podemos transpor do texto para nossas vidas é que não há ser humano debaixo do sol que não tenha de conviver com a dor, o sofrimento das circunstâncias difíceis, o luto das perdas, contudo, a diferença é como processamos as perdas em nosso coração e como continuamos a viver.
Diante das perdas e das circunstâncias difíceis, o que temos cultivado em nosso coração para consolar a nossa alma?
A humanidade tem fabricado os seus próprios consolos, para não dizer seus próprios ídolos e escapes, com a finalidade de consolar a sua alma: os vícios, as dependências de coisas e de relacionamentos, o sexo e o prazer contrários aos padrões de Deus, entre muitos outros que deixam a alma ligada, presa e longe de Deus.
E nesta hora temos de relembrar uma realidade básica acerca de nossa natureza humana: a primeira perda da qual precisamos ser consolados é a perda do relacionamento com Deus. Por causa do pecado, o ser humano é naturalmente separado de Deus, possuindo um vazio na alma que só Ele pode preencher. Na medida em que temos a reconciliação com o nosso Criador, através do arrependimento dos nossos pecados e da fé em Jesus Cristo e na sua obra de salvação, temos de desenvolver uma vida de busca de relacionamento de dependência e intimidade com Ele a fim de que sejamos transformados pelo poder do Espírito Santo, o qual nos convence do pecado, da justiça e do juízo de Deus, guiando-nos em toda a verdade (João 16: 8 e 13).
Muitas vezes, as nossas perdas se dão em nossos relacionamentos. Há pessoas que vão nos ofender, contraindo “dívidas impagáveis” conosco. Nessas circunstâncias, tudo que podemos e devemos fazer é perdoar a fim de que esses relacionamentos partidos sejam curados e tenhamos paz com Deus, uma vez que tudo aquilo que nos separa do nosso próximo nos separa de Deus. Não temos como amar a Deus e odiar o próximo, são realidades incompatíveis entre si e não podem ocupar o mesmo espaço no coração do homem.    
As perdas fazem parte do processo normal da vida humana, contudo, nada acontece por acaso. Não existe acaso, porque todas as coisas estão debaixo da soberana vontade de Deus e Ele quer cumprir um propósito específico em nós através de todas as circunstâncias pelas quais passamos.
Sabemos que todas as coisas cooperam para o bem daqueles que amam a Deus, daqueles que são chamados segundo o seu propósito. Porquanto aos que de antemão conheceu, também os predestinou para serem conforme a imagem de seu Filho, a fim de que ele seja o primogênito entre muitos (Romanos 8:28-29).
O texto acima citado não diz que apenas as coisas boas cooperam para o bem daqueles que amam a Deus, mas “todas as coisas”, inclusive as perdas, as dores, as provações e o propósito destas circunstâncias é formar em nós a imagem de Cristo, já que Deus nos “predestinou para sermos conforme a imagem de seu Filho”. Tais contingências cumprem em nós o propósito de aperfeiçoar o nosso caráter a fim de que Deus seja glorificado através da nossa vida, obras e atitudes, para que sejamos cristãos mais eficazes e operosos para o Reino de Deus.
Deus quer criar em nós um testemunho de superação com o objetivo de manifestar a Sua glória em nossas fraquezas, fazendo-nos superar as circunstâncias mais difíceis de nossa vida. Esse foi o propósito na morte e ressurreição de Lázaro (João 11:4).
Retornando para a narrativa da história, a partir do versículo 28, vemos Maria encontrar-se com Jesus e chorar aos seus pés. A partir daqui, encontra-se um elemento novo, diante da dor e do choro de Maria, Jesus “agitou-se no espírito e comoveu-se” (v.33), ele chorou (v.35) e novamente se agitou em si mesmo (v.38), ordenando que se tirasse a pedra que fechava o túmulo de Lázaro, declarando: “não te disse eu que, se creres, verás a glória de Deus?” (v.40). Jesus orou ao Pai, ordenando em seguida que Lázaro saísse do túmulo, pelo que este saiu, tendo os pés e as mãos ligadas por ataduras e o rosto envolto num lenço (vv. 41-44).
O elemento novo que encontramos aqui é a compaixão de Jesus diante da morte de Lázaro e o sofrimento experimentado por suas irmãs e pelos seus entes queridos. Jesus sofreu junto com eles, compadeceu-se, agitou-se em espírito e chorou.
Jesus é a expressão exata do ser de Deus Pai (Hebreus 1:3). Assim como Jesus se compadece de nossas fraquezas e adversidades, o coração caloroso, gentil, doce e cheio de amor de nosso Deus Pai também se compadece de nós em meio de nossas dificuldades.
O amor de Deus por nós se expressou na criação e também em nossa redenção.
Na criação, formando, com seu imenso amor, cada parte de nosso corpo, atributos, feições, belezas, colocando em nós uma singularidade que nenhum outro ser que tem o fôlego de vida possui, qual seja o privilégio de ser sermos à imagem e semelhança do próprio Deus.
Na redenção, Deus se compadeceu de nossa miséria, dando-nos a oportunidade de salvação e sacrificando em nosso favor o que Ele tem de mais precioso, seu filho Jesus.
Deus não parou por aí. Hoje, Ele nos dá outro tesouro, o Espírito Santo, que nos traz a doce e poderosa presença de Deus, uma presença perpétua e inseparável de nosso ser. Com o Espírito Santo, temos o privilégio de ser a “casa viva de Deus”. Ele se compadece de nós e nos capacita para vivermos uma vida vitoriosa.
Também o Espírito, semelhantemente, nos assiste em nossa fraqueza; porque não sabemos orar como convém, mas o mesmo Espírito intercede por nós sobremaneira, com gemidos inexprimíveis. E aquele que sonda os corações sabe qual é a mente do Espírito, porque segundo a vontade de Deus é que ele intercede pelos santos (Romanos 8:26-27).
Ninguém pode se comparar a este Deus. Você já parou para pensar: como é que criaturas tão decaídas e desobedientes como nós têm o privilégio de ser habitação de um Deus santo e puro?
Você já parou para pensar também: quem você acha que Deus é? Ou melhor, qual é a imagem, o conceito de Deus que você tem em seu coração? Não estou falando a respeito do que você sabe a respeito de Deus por ler a Bíblia, mas do que você realmente sente a respeito dEle em seu coração. Quais são seus sentimentos a respeito de Deus?
Na hora da tribulação, você acha que Deus é um pai insensível, desinteressado, distante, que te abandonou? Ou então, nessas horas, você vê a adversidade como uma oportunidade de crescimento e aperfeiçoamento do seu caráter, sendo uma parte da providência de Deus para a sua vida, percebendo e sentindo Deus como um pai amoroso, presente, educador, interessado em você? Se você percebe e sente Deus da primeira forma, então você tem um coração de órfão e precisa de transformação para viver a vida abundante de Deus. Se você percebe e sente Deus da segunda forma, então você tem um coração de filho.
Em qualquer caso, só tenho um conselho: busque a Deus de todo o seu coração e seja transformado por seu Espírito Santo, entregando-se a Ele, já que somente Ele pode ressuscitar o seu coração, dando-lhe um verdadeiro coração de filho e restaurando a paternidade dEle em sua vida.
A ressurreição de Lázaro nos mostra que algo mais do que um corpo pode ser retirado da morte física. A ressurreição de Lázaro deu à luz a novos convertidos, uma vez que muitos creram nEle (v. 45). O milagre realizado gerou vida espiritual nos corações de muitos, ressuscitando-os da morte espiritual.
E onde está hoje este Espírito de ressurreição? Como já disse, habitando dentro de nós, os remidos em Cristo. Ele opera em nós a energia divina que nos capacita não só para viver uma vida vitoriosa contra o pecado, aperfeiçoando em nós o caráter de Cristo, mas também concede a nós uma energia divina capaz de gerar vida em outras pessoas e sermos o veículo dos milagres de Deus nessa terra. Veja só o que diz o texto de Efésios 1:19-20, na tradução de J. B. Philips: “Quão tremendo é este poder disponível a nós os que crêem em Deus. Este poder é a mesma energia divina que foi demonstrada em Cristo quando Ele ressuscitou-o dos mortos” (traduzido livremente do inglês).
A compaixão de Deus por nós é tão extrema que Ele nos deu o Espírito Santo para habitar em nós com a finalidade de restabelecer o relacionamento anteriormente rompido com Ele, bem como nos propiciar uma transformação de todo o nosso ser. A respeito deste assunto, Leanne Payne, analisando a obra de C. S. Lewis acerca do Espírito Santo e sua união conosco, assim declara:
Deus por seu Espírito pode habitar no homem; cristãos estão ligados com o Absoluto. Com brilhante clareza, Lewis revela que sobre esta realidade todas as filosofias e ideologias do homem tropeçam. Nisto o Cristianismo é diferente de todas as outras religiões. A menos que alguém seja preenchido pela Presença Real do Cristo ressurreto, ele não pode ver o Reino de Deus. O infinito Deus é unido com o dependente e o derivado, com o fraco e mortal, pelo seu Espírito Santo. Este Espírito Santo, habitando o homem, é capaz de reviver a totalidade da personalidade. Cada faculdade do homem está para ser desenvolvida e usada para a glória de Deus, o qual está salvando o homem ao mais extremo e que trará perfeição ao trabalho que Ele começou (PAYNE, Leanne. Real Presence. Grand Rapids: Baker Books, 1995, p. 23, tradução minha).
Continue buscando ao Senhor, cultivando uma amizade íntima com Ele através do seu Espírito Santo e receba a vida ressurreta que Ele quer te dar e seja canal de restauração na vida de outras pessoas, semeando o amor de Deus. Se você tem um coração de órfão e precisa tê-lo transformado em um coração de filho a fim de desfrutar da plenitude da paternidade de Deus em sua vida, saiba que o Espírito Santo, que é o Espírito da ressurreição, pode ressuscitar as áreas mortas de sua vida. Ele é o agente transformador e revelador da convicção da paternidade de Deus em sua vida:
Mas, como está escrito: nem olhos viram, nem ouvidos ouviram, nem jamais penetrou em coração o que Deus tem preparado para aqueles que o amam. Mas Deus no-lo revelou pelo Espírito; porque o Espírito a todas as coisas perscruta, até mesmo as profundezas de Deus (1 Coríntios 2:9-10)   
Tenha um relacionamento de intimidade com o Espírito Santo e Ele revelará no decorrer das experiências de sua vida a profundidade do caráter paterno e amoroso de Deus, transformando o seu coração com as atitudes corretas que você deve tomar em favor da santidade.
Tenha uma atitude de fé e confiança no Senhor, buscando entender o propósito de cada circunstância em sua vida, inclusive as perdas pessoais, com a finalidade de criar em você o caráter de Cristo, porque, assim como foi com Lázaro, uma Palavra que Deus lance ao seu respeito pode lhe ressuscitar e curar as áreas que necessitam ser renovadas e transformadas em sua vida.
Após a realização do milagre, os judeus endureceram ainda mais o coração, mergulharam ainda mais na incredulidade e decidiram matar Jesus (vv. 46-57).
A escolha final é nossa: você vai crer em Jesus, tomando posse de uma vida ressurreta? Ou vai endurecer seu coração, matando Jesus dentro de você?

Pablo Luiz Rodrigues Ferreira
Elaborado de 20 de junho a 05 de julho de 2011
pablolrferreira@hotmail.com
rugidodaverdade.blogspot.com