A RESTAURAÇÃO DA IDENTIDADE DO FILHO: BREVES CONSIDERAÇÕES ACERCA DA PARÁBOLA DO FILHO PRÓDIGO
Em
Lucas 15, encontra-se, sem dúvida, uma das parábolas mais
conhecidas de Jesus: a Parábola do Filho Pródigo. Longe de examinar
a palavra exaustivamente, o presente texto tem a pretensão de tão
somente pontuar algumas lições.
No
contexto da parábola, Jesus falava a uma plateia de pecadores e
publicanos, sendo estes últimos cobradores de impostos a serviço do
império romano e conhecidos como corruptos, cobrando mais do que o
devido. Junto a eles estavam os representantes da elite da religião
judaica, os escribas e fariseus, os quais reclamavam da atitude de
Jesus de receber tão livremente pessoas que, para os padrões da
época, eram consideradas os piores pecadores (Lc 15:1-2). O
formalismo e o legalismo chegaram a um nível tão alto que as
tradições dos rabinos totalizavam mais 600 mandamentos no tempo de
Jesus (cf. MACARTHUR Jr., John. Chaves para o crescimento
espiritual. 5 ed. São José dos Campos: Fiel, 2001, p. 95).
Para
confrontar o sistema de formalismo religioso e a cegueira espiritual
dos escribas e fariseus, Jesus conta três parábolas em Lucas 15,
quais sejam a parábola da ovelha perdida (vv. 3-7), a parábola da
dracma perdida (vv. 8-10) e a parábola do filho pródigo (vv.
11-32). Ambas as histórias têm o mesmo foco, qual seja o de mostrar
a graça abundante e o perdão de Deus e a alegria dos céus em
receber os pecadores arrependidos outrora perdidos.
O
judaísmo dos tempos de Jesus não trabalhava bem com a ideia da
graça abundante de Deus. Um pecador que quisesse voltar aos caminhos
do Senhor tinha de se submeter a uma dura disciplina religiosa. O
pecador não era recebido livremente, mas tinha de passar pelos
rituais religiosos do judaísmo e provar que de fato deveria merecer
o perdão de Deus, acrescentando-se o fato de que havia muita
discriminação em relação a alguns tipos de pecadores [alguma
diferença nos dias de hoje?].
Passemos,
então, ao texto da parábola:
“Continuou:
Certo homem tinha dois filhos; o mais moço deles disse ao pai: Pai,
dá-me a parte dos bens que me cabe. E ele lhes repartiu os haveres”
(Lucas 15:11-12).
Neste
contexto, o filho mais novo pede ao seu pai a sua parte na herança.
A primeira coisa que se pode observar é que a palavra original do
grego que o filho usa para pedir a sua herança não é a comumente
usada para tal, ou seja, referente aos bens imóveis. O filho pródigo
pediu, em verdade, para que o pai vendesse a sua parte na herança e
em troca lhe desse dinheiro e não terras. Isso tinha uma razão
muito simples: se o filho recebesse sua herança em imóveis teria de
cultivá-los e, portanto, ficaria preso ao sistema rural daquela
sociedade, e mais, ficaria ainda sob a autoridade de seu pai, uma vez
que, somente quando o pai morresse, é que definitivamente a
propriedade seria transferida; em vida, as propriedades eram do pai,
os filhos ficavam apenas como usufrutuários, isto é, tinham a
posse, o direito de usar a propriedade, de gozar dos frutos da terra,
mas não poderiam dispor da mesma, vendendo-a, por exemplo, além do
fato de que o filho pródigo estaria sob a autoridade do pai e teria
de lhe prestar contas. A palavra grega para herança neste contexto é
“bios”, ou seja, a palavra grega que significa “vida”.
O pai deu ao filho sua vida inteira, sua herança e tudo o que a
família tinha acumulado durante as gerações antecedentes.
Entretanto,
os planos do filho pródigo eram diferentes, ele queria sair da
autoridade do pai e sair do sistema agrário em que vivia, morar
longe sem ter a quem prestar contas. Como todo jovem, queria
“curtição”:
“Passados
não muitos dias, o filho mais moço, ajuntando tudo o que era seu,
partiu para uma terra distante e lá dissipou todos os seus bens,
vivendo dissolutamente”
(Lucas 15:13).
Esse
é um claro retrato do gênero humano: a separação de Deus e a
vida de rebelião e desobediência. Queremos viver de acordo com
as nossas próprias razões e convicções e não de acordo com o
padrão que Deus nos propõe e, vivendo essa “liberdade”, em
verdade, não conseguimos nada além de trazer sobre nós a ruína e
a miséria do pecado, dando oportunidade para que o inimigo de nossas
almas nos roube, destrua ou mate. Foi exatamente o que aconteceu com
o filho pródigo, viveu dissolutamente e colheu a miséria e o vazio
do pecado:
“Depois
de ter consumido tudo, sobreveio àquele país uma grande fome, e ele
começou a passar necessidade. Então, ele foi e se agregou a um dos
cidadãos daquela terra, e este o mandou para os seus campos a
guardar porcos. Ali, desejava ele fartar-se das alfarrobas que os
porcos comiam; mas ninguém lhe dava nada”
(Lucas 15:14-16).
O
“fundo do poço” chegou na vida do filho pródigo, até os porcos
tinham uma sorte melhor que a dele, pois tinham o que comer. Na
miséria, fruto de sua desobediência, o filho lembrou do bom caráter
de seu pai:
“Então,
caindo em si, disse: Quantos trabalhadores de meu pai têm pão com
fartura, e eu aqui morro de fome! Levantar-me-ei, e irei ter com o
meu pai, e lhe direi: Pai, pequei contra o céu e diante de ti; já
não sou digno de ser chamado teu filho; trata-me como um dos teus
trabalhadores”
(Lucas 15:17-19).
Assim
como o filho pródigo, um dia chegamos a conclusão de que a nossa
vida não valeu a pena sem cuidado amoroso de Deus e, então,
planejamos o “caminho de volta para casa”, o caminho do
arrependimento e da confissão de pecados, esperando que, apesar
da nossa indignidade e das marcas da vergonha da desobediência do
pecado, Deus de alguma forma nos receba e nos restaure. Mas note, o
filho pródigo não voltou para o pai sem antes esgotar todos os seus
próprios meios de solucionar os seus problemas, qual seja de
arranjar um emprego para se sustentar, já que esperou muito para ter
a tão sonhada “liberdade” em relação a autoridade do pai, o
que demonstra claramente o retrato da justiça própria humana;
sempre tentamos administrar as circunstâncias da nossa vida sozinhos
e só recorremos e consultamos a Deus quando tudo falha; fazemos uma
série de maquinações para evitar o arrependimento e a confissão
dos pecados.
O
filho pródigo sabia que tinha não só desonrado seu pai, como
também transgredido a lei de Deus. Honrar pai e mãe é o quinto
mandamento. Para aquela época, pedir a antecipação da herança
para o pai equivalia a dizer: “Pai, queria que você estivesse
morto, você está atrapalhando meus planos. Você é uma barreira.
Eu quero a minha liberdade. Eu quero a minha realização pessoal. E
quero deixar essa família agora. Tenho outros planos que não
incluem você, esta família, esta propriedade e nem mesmo esta
cidade. Eu não quero me relacionar com nenhum de vocês. Dê-me a
minha herança agora porque vou embora daqui” (MACARTHUR, John.
A parábola do filho pródigo. Rio de Janeiro: Thomas Nelson
Brasil, 2009, p. 63).
O
pecado do filho pródigo merecia a morte, segundo a lei de Moisés
(Deuteronômio 21:18-21), a qual prevê a morte por apedrejamento
para os filhos incorrigíveis. Aliás, naquela época era comum fazer
um funeral para o filho vivo que saísse daquela forma de casa.
O
filho pródigo queria voltar agora para casa, mas sabia que, de
acordo com as tradições legalistas da época, sua convivência
familiar nunca voltaria a ser como antes. Sabia que não tinha mais
direito a qualquer herança e que teria de trabalhar duro para
merecer o pão de cada dia, isso se seu pai o quisesse de volta em
casa. Ele não tinha alternativa senão a de confiar na misericórdia
e na bondade de seu pai para admiti-lo ao menos como empregado.
“E,
levantando-se, foi para seu pai. Vinha ele ainda longe, quando seu
pai o avistou, e, compadecido dele, correndo, o abraçou, e beijou. E
o filho lhe disse: Pai, pequei contra o céu e diante de ti; já não
sou digno de ser chamado teu filho. O pai, porém, disse aos seus
servos: Trazei depressa a melhor roupa, vesti-o, ponde-lhe um anel no
dedo e sandálias nos pés; trazei também e matai o novilho cevado.
Comamos e regozijemo-nos, porque este meu filho estava morto e
reviveu, estava perdido e foi achado. E começaram a regozijar-se”
(Lucas 15:20-24).
A
história agora passa por uma grande reviravolta, depois destas
palavras de Jesus, os escribas e fariseus devem ter “surtado”; a
essas alturas devem ter pensado: “como
assim, ele perdoou e restabeleceu os privilégios do filho mais novo
sem qualquer punição ou condição?”.
É, foi exatamente isso que aconteceu. O perdão do pai escandalizou
a “justiça” dos fariseus já que, de acordo com a perspectiva
deles, o filho deveria no mínimo ser exposto ao escárnio público
pelo que fez. É com o perdão e aceitação incondicionais que Deus
nos trata quando nos arrependemos. Não precisamos provar a Deus que
merecemos o seu perdão e, aliás, nada do que façamos pode comprar
qualquer benefício de Deus em nosso favor. Tudo que ganhamos de Deus
é fruto de sua graça, de um favor imerecido. Hoje, em tempos de
ativismo religioso, muitas pessoas são levadas a achar que pelo fato
de estarem em algum ministério, obra, evangelizando pessoas, tendo
uma “multidão de discípulos”, estão em um nível mais elevado
do que os outros irmãos que não desempenham tais “funções” ou
acham que merecem mais bênçãos do que os outros. A graça de Deus
nos alcançou igualmente e incondicionalmente. Nosso relacionamento
com Deus não é medido por obras de nossa parte, mas pelo amor
incondicional que Deus destina a nós, pobres humanos decaídos pelo
pecado. O nosso maior privilégio é o fato de que Deus nos ama e de
que nos trata segundo a sua graça abundante. Deus somente requer de
nós arrependimento de nossos pecados e uma vontade de segui-lo até
o fim de nossos dias, amando-o e também ao nosso próximo. O resto
ele fará e fará com excelência.
Como
disse acima, o perdão do pai escandalizou a “justiça” dos
fariseus, porém esta não foi a única coisa escandalosa que o pai
fez. Ele também correu atrás do filho mais novo. Para aquela
cultura, correr atrás do filho só agravava a vergonha do pai.
Nobres não corriam. Correr era para os servos e para as criancinhas.
Adultos não corriam, principalmente homens de dignidade e respeito.
Por esse motivo, muitos tradutores da Bíblia em árabe usavam outras
expressões no lugar de “correr”, tais como “ele se apressou”
ou “ele se apresentou” e, somente em 1960, com o advento da
Bíblia árabe Bustani-Van Dick, o pai aparece correndo. O pai
era identificado com Deus e era vergonhoso demais atribuir a palavra
“correr” para uma pessoa que simbolizava Deus (cf. MACARTHUR,
John. A parábola do filho pródigo. Rio de Janeiro: Thomas
Nelson Brasil, 2009, p. 132). Esta é uma figura de Cristo que toma a
iniciativa na salvação; Ele nos amou primeiro e não mede esforços
para nos resgatar, chegando até o ponto da morte de cruz, suportando
a desonra e a vergonha que merecíamos.
O
pai estava ansioso para perdoar e, assim, Deus nos espera para que
tenhamos relacionamento com Ele. O pai estava “cheio de compaixão”;
a palavra grega guarda um significado ainda mais profundo, conotando
uma sensação visceral, ou seja, uma emoção tão forte que fez seu
estômago se revirar (cf. MACARTHUR, John. A parábola do filho
pródigo. Rio de Janeiro: Thomas Nelson Brasil, 2009, p. 133).
O
pai renunciou a toda a forma de punição e castigo, suportou a
vergonha e a desonra, renunciou ao orgulho ferido, aceitando seu
filho de volta. O pai ofereceu sua aceitação plena, amizade, amor,
perdão, restauração e total reconciliação, sem qualquer obra por
parte do filho. Jesus queria mostrar o quanto os fariseus tinham uma
imagem deformada de Deus em seus corações, um deus legalista,
iníquo, inflexível e vingativo. Embora não seja o foco principal
da parábola, Jesus queria mostrar que a salvação e a justificação
do homem diante de Deus não eram por obras, isto é, ninguém
precisa fazer algo para merecer o perdão de Deus.
O
pai do filho pródigo não só o perdoou, mas lhe restituiu os
privilégios. A condição de filho foi restituída. Os calçados
simbolizavam isso, uma vez que andar descalço era para os escravos e
empregados; somente os patrões andavam calçados, mostrando mais uma
vez que a aceitação do pai foi completa. Assim também Deus faz
conosco.
O
pai também mandou trazer a melhor roupa para o filho, a roupa
reservada para as grandes ocasiões, a expressão grega literalmente
significa “roupa de primeira”. Espiritualmente, esta roupa
significa a “veste de louvor em vez de espírito angustiado”
(Isaías 61:3). É o dom da honra sendo restituído e cobrindo toda a
vergonha causada pelo pecado e a desobediência, uma obra que o
Espírito Santo produz em nós e que Deus pai com muito carinho
providencia.
Por
fim, o pai deu um anel ao filho, o qual era um sinete que tinha a
insígnia da família, o qual servia para dar autenticação legal.
Aqui é o dom da autoridade sendo restituído (cf. MACARTHUR, John. A
parábola do filho pródigo. Rio de Janeiro: Thomas Nelson
Brasil, 2009, p. 146-148). Espiritualmente, o anel significa que
somos declarados como autênticos, legítimos em autoridade, selados
com o Espírito Santo, como fala o apóstolo Paulo: “(...)
fostes selados com o Espírito Santo da promessa; o qual é o penhor
da vossa herança, até ao resgate da sua propriedade, em louvor da
sua glória” (Efésios 1:13-14). O anel é um selo com o qual
se marcava documentos importantes, dando-lhes autenticidade,
veracidade, segurança e autoridade e é assim que o Espírito Santo
nos sela. “O Espírito de Deus mesmo vem morar no crente, em
grande parte para assegurar e preservar sua salvação eterna. O selo
de que fala Paulo se refere a uma marca oficial de identificação
que se colocava em cartas, contratos e outros documentos importantes.
Assim o documento ficava sob a autoridade autentica e oficial da
pessoa cuja marca ficava impressa no selo. Há quatro verdades
primordiais que se estabelecem por meio de um selo: 1) segurança; 2)
autenticidade; 3) propriedade e 4) autoridade. O Espírito Santo é
dado por Deus como seu juramento da herança futura do crente na
glória” (MACARTHUR, John. La Biblia de Estudio Maccarthur.
Grand Rapids: Editorial Porta Voz, 2004, p. 1655). Essa é a obra que
Deus faz conosco ao nos reconciliarmos com Ele.
A
alegria no céu quando um pecador se arrepende é ilustrada pela
celebração que o pai fez, além da matança do novilho gordo, que
representa o sacrifício de Cristo pelos nossos pecados.
A
história agora passa por uma nova reviravolta:
“Ora,
o filho mais velho estivera no campo; e, quando voltava, ao
aproximar-se da casa, ouviu a música e as danças. Chamou um dos
criados e perguntou-lhe que era aquilo. E ele informou: Veio teu
irmão, e teu pai mandou matar o novilho cevado, porque o recuperou
com saúde. Ele se indignou e não queria entrar; saindo, porém, o
pai, procurava conciliá-lo. Mas ele respondeu a seu pai: Há tantos
anos que te sirvo sem jamais transgredir uma ordem tua, e nunca me
deste um cabrito sequer para alegrar-me com os meus amigos; vindo,
porém, esse teu filho, que desperdiçou os teus bens com meretrizes,
tu mandaste matar para ele o novilho cevado. Então, lhe respondeu o
pai: Meu filho, tu sempre estás comigo; tudo o que é meu é teu.
Entretanto, era preciso que nos regozijássemos e nos alegrássemos,
porque esse teu irmão estava morto e reviveu, estava perdido e foi
achado”
(Lucas 15:25-32).
Agora,
o filho mais velho entra em cena e não gosta nada da situação com
a qual se deparou. O filho mais novo, o qual tinha dilapidado toda a
sua herança e desonrado gravemente o seu pai, agora estava sendo
agraciado com uma festa em comemoração pela sua volta e sendo alvo
com toda a espécie de honra. O filho mais velho agora estava
ressentido com a atitude do pai. O filho mais velho simboliza a casta
religiosa de escribas e fariseus. É o próprio espírito de
religiosidade, incapaz de sentir a alegria pelo fato do irmão ter se
salvado, clamando pelo castigo ao invés da aceitação e perdão
incondicionais que o pai poderia destinar ao filho mais novo. E
quantas vezes não somos como o filho mais velho? Estamos dentro da
casa do Pai, cumprimentamos nossos irmãos, mas não gostamos do que
o nosso Pai gosta, não aprendemos a agir como Ele age e não
tentamos trilhar o caminho sobremodo excelente do amor, não
aprendemos a renunciar aos nossos direitos e razões para viver uma
vida mais junto dEle. Ficamos na “justiça legal” e nos ritos
religiosos, até choramos nos cultos, mas lá dentro do nosso
coração, onde ninguém pode ver, nutrimos um coração mau, cheio
de ingratidão, reclamando, murmurando de tudo. O mínimo que se
esperava do filho mais velho era que fosse grato por ter desfrutado
da companhia do pai durante anos e de ter consigo a alegria de saber
que seu irmão voltou salvo, escapou da morte e da desgraça e agora
poderia desfrutar de um novo começo em sua vida. A companhia com pai
deveria ter lhe possibilitado ser bondoso como seu pai o era.
O
filho mais velho era tão rebelde quanto o mais novo foi no começo,
porém seus sentimentos ficaram ocultos e a sua rebeldia camuflada. O
filho mais velho chegou até mesmo a insinuar que merecia mais do que
o mais novo por ter trabalhado muito e ter sido obediente as suas
ordens. Este é um detalhe importante: muitas vezes, pensamos que
religiosidade é somente a do cara que sabe tudo de Bíblia e é
muito julgador e legalista, mas o texto lança uma luz sobre outro
tipo de religiosidade, qual seja a do ativismo religioso: é o
fazer desenfreado de obras e eventos para a igreja sem a motivação
de realmente agradar a Deus. A pessoa acaba se tornando “um fazer
humano” com a motivação de preencher suas necessidades de
autoafirmação, agindo na cegueira espiritual, pensando que tem
algum “mérito” diante de Deus pelo que faz e que é até mais
importante do que outras pessoas pelo que faz. Enfim, toda a obra
realizada é feita como fruto de orgulho espiritual. A palavra grega
usada pelo filho mais velho é “doulos”, ou seja, escravo,
ele literalmente diz que trabalhou como um escravo para o pai, o que
mostra a verdadeira face da religiosidade, qual seja a escravidão
espiritual.
Analisando
o texto da parábola, vemos que Jesus se utiliza de duas palavras
gregas diferentes para filho: “huios” e “teknon”.
A primeira forma é a palavra formal para filho, o filho maduro com
todos os privilégios. A segunda forma é a do filho imaturo. Em
Lucas 15:31, Jesus usa a palavra “teknon” para o filho
mais velho, o qual é representativo dos fariseus. Infelizmente, é
assim que somos quando nós estamos presos pela religiosidade, seja
ela na forma do legalismo, seja na forma do ativismo religioso,
imaturos espiritualmente, escravos de rituais, de cultos, de mostrar
nosso valor através de obras e serviços, escravos do orgulho,
escravos da lei, escravos de pessoas, sem uma identidade própria no
Reino de Deus.
Deus
quer que cheguemos ao patamar do filho maduro, com todos os
privilégios de um relacionamento com Ele. Romanos 8:19, assim diz:
“A ardente expectativa da criação aguarda a revelação dos
filhos de Deus”. Aqui a palavra é “huios” para
filho, pois somente filhos maduros, com os frutos do Espírito Santo,
com uma identidade forte no Senhor, podem realmente fazer a obra dEle
sem roubar a glória que somente é devida a Ele, impactando uma
sociedade em decadência e revertendo um histórico de degradação
espiritual que ela apresenta.
Temos
que ser sarados nessa dimensão de filho de Deus, desfrutando de um
relacionamento paterno profundo com Deus, caso contrário, seremos
filhos “bastardos” ou “órfãos”, servos que buscam seus
próprios interesses e uma noiva “prostituta”.
A
parábola nos mostra uma importante lição neste particular, a
respeito da nossa cura: o milagre tem de acontecer dentro da nossa
própria casa. Em Êxodo 20:12, tem-se o quinto mandamento nos
termos a seguir transcritos: “Honra teu pai e tua mãe, para que
se prolonguem os teus dias na terra que o Senhor, teu Deus, te dá”.
Infelizmente,
vivemos uma época em que nunca este princípio foi tão abandonado.
O inimigo de nossas almas tem investido pesado para que as famílias
sejam, cada vez mais, desestruturadas, colocando filhos contra os
pais e os pais contra os filhos, a fim de que as pessoas não tenham
um referencial seguro do amor paterno de Deus, causando todo tipo de
deformidade na personalidade e emoções das pessoas, tais como a
rejeição, o senso de abandono, os complexos de inferioridade, a
ansiedade, os ciúmes, entre outros. Nada desestrutura mais as
emoções e a personalidade de um ser humano do que ter um
relacionamento partido com seus pais, do que sentir mágoa, rancor e
ressentimento contra as pessoas que deveriam ser fonte de amor e
aceitação incondicionais.
Como
resultado desses relacionamentos partidos com os nossos pais e as
mágoas deles decorrentes, nós não conseguimos ter uma percepção
em nossas emoções mais íntimas de que, de fato, Deus é um pai
bondoso que nos ama e nos aceita incondicionalmente. Transferimos
para Deus todas as emoções que sentimos em relação aos nossos
pais, de modo que passamos a ver Deus do mesmo modo que percebemos e
vemos nossos pais.
Se
tivemos o cuidado e o carinho afetuoso de nossos pais desde os
primeiros anos da infância, teremos condições para enxergar Deus
como um pai amoroso, contudo, se nossos pais foram severos, críticos,
injustos, ausentes quando necessário, cheios de ódio, nós
enxergaremos Deus da mesma forma, ou seja, de uma maneira deformada.
E não somente isso, os relacionamentos partidos com nossos pais
prejudicarão todos os nossos relacionamentos pessoais,
transferiremos para outras pessoas, principalmente para as pessoas
que desempenham funções de liderança em nossas vidas, todo o amor
que gostaríamos de ter recebido de nossos pais, mas também
transferiremos todo o nosso ódio e frustração (cf. SEAMANDS, David
A. A cura das memórias. 2ª ed. São Paulo: Mundo Cristão,
2007, p. 77-87). Além do que cultivaremos toda a espécie vício e
dependência, inclusive a dependência emocional em relação as
pessoas.
A
única maneira de nos curarmos na nossa dimensão de filho e
recuperar uma saúde emocional que nos possibilite viver o Evangelho
é a restauração do princípio da honra em nossas vidas,
isto é, o perdão e a reconciliação nas nossas relações
familiares, principalmente com nossos pais. Devemos perdoar os nossos
pais pelas falhas do passado e começar a semear amor onde antes não
existia, semear amor, respeito e aceitação incondicionais em
relação a eles, reconhecendo que, se tivemos uma relação difícil
na família, isso se deveu em virtude da atuação maligna do inimigo
de nossas almas, que veio para matar, roubar e destruir o que temos
de melhor. Nossos pais também precisam de amor para ser restaurados
e se render ao Evangelho de Cristo, porque também foram vítimas da
atuação do nosso inimigo e, com certeza, também tiveram uma vida
complicada em relação aos pais deles. Precisamos desse nível de
cura a fim de que não repitamos o mesmo quadro de rejeição com os
nossos filhos. Irmão, não se engane, se não atingirmos esse nível
de cura, repetiremos os mesmos abusos que sofremos, porque ferimos os
outros da mesma forma que fomos feridos.
A
nossa família é o nosso maior patrimônio. E, se não nos
restauramos nesse nível, será muito difícil viver o Evangelho,
pois a essência do Evangelho é o amor. Enquanto não renovarmos a
nossa mente nessa área, seremos cegos espiritualmente e, portanto,
um alvo fácil para a atuação do inimigo. Veja o diz Provérbios
30:17: “Os olhos de quem zomba do pai ou de quem despreza a
obediência à sua mãe, corvos no ribeiro os arrancarão e pelos
pintãos da águia serão comidos”. Infelizmente, o caminho
para aqueles que não passam pela porta do perdão e da reconciliação
na família é este, não desfrutaremos do melhor de Deus para nossas
vidas por causa da cegueira espiritual. E que maior bênção podemos
ter do que ver Deus como Ele é e desfrutar de seu amor paternal?
Precisamos
da unção de Elias nesses últimos dias, ou seja, uma profunda
restauração na área familiar, como foi profetizado pelo profeta
Malaquias: “Eis que eu vos enviarei o profeta Elias, antes que
venha o grande e terrível Dia do Senhor; ele converterá o coração
dos pais aos filhos e o coração dos filhos a seus pais, para que eu
não fira a terra com maldição” (Malaquias 4:5-6).
Esta
é a chave do avivamento que tanto ansiamos para o nosso tempo. De
nada adianta termos o culto mais animado da face da terra, o melhor
louvor, uma boa visão de igreja a perseguir e até mesmo as
manifestações sobrenaturais do Espírito de Deus, se nós não
voltarmos para a essência do Evangelho de Cristo e de seu caráter.
A unção sobrenatural de Deus vem, mas os “vasos” não estão
inteiros, estão cheios de grandes rachaduras e toda a unção
liberada não é retida, mas escorre pelas brechas. Enfim, um dia
acordamos e percebemos que tudo não passou de apenas mais um “mover
do Espírito Santo”. Quem sabe a próxima geração consiga.
Irmão,
não queira deixar para a próxima geração aquilo que Deus pode
realizar no tempo que se chama hoje em sua vida.
Meu
desejo para você leitor é que o melhor de Deus aconteça em sua
vida. Faça a sua parte, porque é fiel para fazer a parte dEle no
meio do processo. Deus é um pai bondoso e não medirá esforços
para ver você restaurado, basta você querer trilhar o “caminho
sobremodo excelente do amor” (1 Coríntios 13).
Pablo
Luiz Rodrigues Ferreira
rugidodaverdade.blogspot.com.br
pablolrferreira@hotmail.com
Palavra muito boa. Fui bastante edificado.
ResponderExcluirajudar te palavras certas para ajudar em todas as cituacoes.
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